sábado, abril 23, 2016

A deputada Joana Mortágua denúncia no parlamento português o golpe em Brasil - Vídeo


Quem em Portugal se prestou ao papel de claque dos golpistas da direita brasileira agora só pode calar-se com vergonha.

Depois das declarações de voto de 367 deputados a favor do impeachment já não é possível branquear o que aconteceu:

Pela esposa Paula, pelo neto Gabriel, pela sobrinha Helena, pela tia que me cuidou quando eu era criança, pelos corretores de seguros do Brasil, pelos evangélicos, pelo petróleo, para acabar com a Central Única dos Trabalhadores e os seus marginais, pela Ditadura Militar de 1964 e em homenagem ao torturador Alberto Brilhante Ulstra, que foi o pavor de Dilma Rousseff.

Quem em Portugal se prestou ao papel de claque dos golpistas da direita brasileira agora só pode calar-se com vergonha. E percebe-se porquê: Entre deus e o mundo, tudo foi razão para derrubar a presidente do Brasil. Tudo menos o tal crime de responsabilidade que seria a única justificação legal para o impeachment.

O debate correu, e dos fundamentos formais do impeachment nem sinal. Foram esquecidos até pelos organizadores do golpe como desculpas esfarrapadas que eram. E só podemos esperar que o combate à corrupção não vá pelo mesmo caminho.

Nunca nos ouvirão branquear o pântano de corrupção que domina a política brasileira. Nunca nos ouvirão negar envolvimento de altos responsáveis do PT no Mensalão, no Lava Jato ou noutros escândalos de favorecimento pessoal ou partidário em prejuízo do povo brasileiro. No Brasil, como em Portugal, a corrupção deve ser combatida e os corruptos devem ser sujeitos à justiça mais incomplacente.

Mas não foi isso que aconteceu no domingo. Se assim fosse, todo o sistema político brasileiro teria de ser alvo de impeachment por ser feito para favorecer a compra de votos, o financiamento privado de partidos, a troca de favores e a corrupção do poder político.

Se alguma coisa poderia ter evitado o desfecho inconstitucional desta história, era a reforma política e a democratização do sistema político que próprio PT prometeu e falhou em cumprir.

É que, ao contrário de Dilma Russeff, 60% dos deputados que votaram SIM à sua destituição estão a braços com a justiça. Correu mundo o caso da deputada Raquel Moniz do PSD (brasileiro) que dedicou o seu voto ao marido Ruy Moniz, Prefeito de Montes Claros, exemplo de gestor público de mãos limpas mas que na manhã seguinte foi preso pela Polícia Federal por envolvimento em corrupção.

O argumento da transparência não tem credibilidade na boca dos corruptos. Falemos dos organizadores do Golpe: Michel Témer, atual vice e pretenso sucessor à presidência é suspeito em investigações da Lava Jato.

Eduardo Cunha, pai do impeachment e Presidente da Câmara de Deputados, é réu no Supremo Tribunal Federal no caso Lava Jato e está em risco de perder o mandato por ter mentido numa Comissão Parlamentar de Inquérito para esconder contas bancárias no estrangeiro.

A verdade é que o processo de cassação do mandato de Eduardo Cunha corre muito mais lento do que o processo de impeachment de Dilma Rousseff, e veremos se o agradecimento da direita brasileira a Eduardo Cunha não será a amnistia e a impunidade.

No final de 72h de discussão na Câmara de Deputados há uma pergunta que é obrigatória: O impeachment resolve algum problema de corrupção? Não. Mas, a confirmar-se, o impeachment é a vitória da corrupção.

O impeachment é a vitória de um sistema iníquo e de uma direita conservadora que viu uma oportunidade para assaltar o poder.

É verdade que o impeachment é um instrumento legal, mas as suas regras estão constitucionalmente previstas. Quando as causas que o justificam são falsas, quando o seu motivo é político e não judicial, quando falham as provas, quando se forjam argumentos, então estamos perante uma farsa, um puro golpe de oportunistas.

Para encobrir o nepotismo e proteger os seus próprios interesses os golpistas não se limitaram a opor-se ao Governo, atiraram à Constituição e, com ela, à democracia. Falta saber se avançam para a revisão da Constituição de 1988, afinal basta que uma maioria de deputados se junte pelos mesmos netos e esposas.

O Bloco de Esquerda não vem hoje a esta Tribuna discutir Governos, Governantes ou as suas opções políticas. Aqui levantamo-nos pela democracia, a par de tantos democratas, para lamentar que no Brasil um Governo democraticamente eleito povo possa cair não pelo voto do povo mas às mãos de um golpe feito em nome de interesses corruptos e corrompidos.

Aqueles que nos acusaram de ingerência por defendermos a democracia em Angola não tiveram pudores em defender o golpe no Brasil. Por isso, e antes que a hipocrisia dos interesses nos perturbe a razão, aqui estamos para lembrar que o papel dos democratas é defender a democracia, seja onde for.

Há poucas semanas, quando o Bloco de Esquerda se pronunciou claramente contra o golpe do impeachment, não faltou quem saltasse a terreiro para nos acusar de cumplicidades e encobrimentos.

Como já disse, ninguém espere nunca do Bloco o silêncio e a complacência sobre privilégio e abuso de poder. Mas hoje, depois de tudo o que o mundo viu nas últimas desgraçadas semanas no Brasil, pergunto aos senhores deputados de todas as bancadas e em particular aos deputados das bancadas da direita parlamentar: acham mesmo que é pela democracia e pela transparência que se move a direita golpista do Brasil?


https://www.youtube.com/embed/b76pGr_5vQw

[*] Joana Mortágua, deputada e dirigente do Bloco de Esquerda, licenciada em relações internacionais.

Fonte: esquerda.net.

Enlace relacionado:

Ártabra 21: Chamado urxente de solidariedade con Brasil - A Marcha Mundial das Mulleres chama á solidariedade internacional contra o intento de golpe institucional e en defensa de Dilma Rousseff.
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